Espécie de peixe possivelmente extinta é redescoberta em Itanhaém (SP)
29/10/2024
Animal vive em poças temporárias em meio à floresta de restinga. Espécie Leptopanchax itanhaensis redescoberta em Itanhaém (SP)
Amanda Selinger
Um peixe considerado possivelmente extinto foi redescoberto em Itanhaém (SP) no início deste ano, surpreendendo os pesquisadores que acreditavam na sua extinção há quase duas décadas. A descoberta foi publicada na revista Biota Neotropica no último dia 14 de outubro.
A espécie, Leptopanchax itanhaensis, descrita oficialmente em 2008 com registros anteriores de 2000 e 2005, vivia em uma poça que foi destruída em 2007. Desde então, múltiplas tentativas de encontrar novos exemplares fracassaram, levando os especialistas a concluir que o peixe poderia estar extinto — uma suposição desmentida em fevereiro deste ano com a nova e rara aparição.
De acordo com João Henrique Alliprandini da Costa, pesquisador e doutorando na UNESP Câmpus do Litoral Paulista, em São Vicente, diversos fatores contribuíram para essa descoberta. Um deles foi seu projeto de doutorado, que busca entender a composição das espécies que habitam poças temporárias e valas de estrada, como o Leptopanchax itanhaensis. A realização de coletas nesses locais aumentou a probabilidade de encontrar o animal. Além disso, sabendo da possibilidade, os pesquisadores decidiram ir até a coordenada mencionada na descrição original da espécie, que indicava a poça onde ela foi inicialmente localizada.
Na ocasião, os pesquisadores encontraram cinco indivíduos de Leptopanchax itanhaensis em uma poça temporária e em uma vala de estrada na sub-bacia do Rio Preto. Até o momento acredita-se que o animal ocorra somente em Itanhaém.
Momento da retirada do primeiro exemplar redescoberto
Amanda Selinger
“Não conseguimos achar nada na coordenada exata, mas na mata ao redor foi possível reencontrar a espécie. No mês de março, encontramos a espécie por acaso em uma vala de estrada que já amostrávamos fazia algum tempo. Então esse conjunto de informações, mais o fato de estarmos em meses mais chuvosos, uma vez que essa espécie é um peixe anual – ou seja, os ovos eclodem com a chuva – levou até esse momento”, revela o pesquisador.
Para João, o mais significativo nessa redescoberta é a esperança que ela desperta para a conservação da espécie, restrita àquela região específica e a um território limitado. Ele acredita que o sentimento predominante é o de que ainda há muito a ser explorado e compreendido sobre o animal.
“A sensação foi uma mistura de choque e felicidade. Estava acostumado a ver vídeos no Instagram de pesquisadores encontrando espécies de aves presumidas como possivelmente extintas, e se abraçando. No nosso caso, claro que a felicidade foi constante, pela espécie, mas a competição entre os membros da equipe para ver quem conseguia encontrar mais um indivíduo (o que é muito importante para os dados da pesquisa) e para dar a atenção necessária ao peixe (como levar ele ainda em vida para a fotografia), foi alta! Isso se deve ao fato da nossa equipe estar trabalhando durante muito tempo juntos, e ter muita sintonia, mas no fundo – foi divertido”, conta João.
Além disso, o doutorando comenta que, embora os pesquisadores estejam frequentemente acostumados a observar e falar sobre biodiversidade em grandes escalas — o que é realmente essencial —, olhar sob a perspectiva de uma única espécie traz um valor especial.
Coordenadora Ursulla Pereira Souza coletando na poça em que a espécie foi reencontrada
Amanda Selinger
“Descobrir que ela ainda está ali é um primeiro passo para conhecê-la, e, consequentemente, conservá-la. E, por mais que para nós pode vir a parecer que é apenas uma espécie, para a preservação dela, significa muito mesmo. Assim, isso é apenas um pequeno primeiro passo para muito trabalho que tem que ser feito para a conhecer e preserve a espécie, que só existe em Itanhaém. E isso, abre portas para muitas pesquisas”.
A espécie
Até o momento, sabe-se que essa espécie habita poças temporárias em meio à floresta de restinga, caracterizadas por águas extremamente ácidas e com baixa concentração de oxigênio, devido à característica do próprio Rio Preto.
Informações adicionais sobre o peixe ainda são limitadas, e os pesquisadores estão investigando aspectos de sua fisiologia, alimentação e reprodução para compreendê-la melhor.
“O tamanho máximo registrado para a espécie quando descrita foi de 2,5 cm, ou seja, a espécie é, naturalmente, de pequeno tamano corpóreo. Acreditamos sim, que o tamanho reduzido da espécie pode ter dificultado os avistamos da espécie, apesar do registro de esforços de coleta atrás dela”, aponta João.
Ele ainda conta que a maioria das espécies do gênero Leptopanchax são raras na natureza e ameaçadas de extinção.
Equipe de pesquisadores envolvidos na redescoberta da espécie
Amanda Selinger
Os pesquisadores estão realizando o monitoramento das poças temporárias na região mensalmente, não necessariamente por conta da espécie redescoberta, mas por todas as outras que estão estudando no conjunto.
A pesquisa é orientada pelo professor Dr. Rafael Mendonça Duarte, da UNESP, com coorientação da professora Dra. Ursulla Pereira Souza, da UNISANTA. O artigo resultante dessa pesquisa foi assinado pelo professor Dr. Francisco Langeani, da UNESP de São José do Rio Preto, além dos mestrandos da UNISANTA, Amanda Selinger e Thomas Alves Vidal.
O projeto conta com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia - Centro de Estudos de Adaptações Aquáticas da Amazônia (INCT - ADAPTA II).
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